O motivo da disputa desse período não é a retomada do futebol pela associação civil sem fins lucrativos, o Club de Regatas Vasco da Gama, mas sim a possível revenda para outro conglomerado empresarial. As negociações entre 777, Vasco e Crefisa estão em curso há meses.
Apesar de Leila Pereira ter afirmado em uma entrevista no dia 22 de abril, ao programa Roda Viva, da TV Cultura, que não investiria no Vasco, a empresa liderada por ela e por seu marido, José Roberto Lamacchia, está em negociações financeiras e realizou, inclusive, uma análise minuciosa (due diligence) sobre a 777.
Leila não está diretamente envolvida nas negociações, que são conduzidas por Lamacchia com o apoio de seu advogado. E a empresa utilizada pode vir de outro ramo do grupo, como a Crefipar Participações e Empreendimento.
— Tenho uma forte amizade com o senhor José Lamacchia, e a Leila é uma referência para mim em gestão esportiva e coragem. Porém, as pessoas se confundem. Minha ligação com o senhor José não se mistura com a Leila. Minha relação é direta com o Lamacchia, que sempre se mostrou muito disposto a ajudar o Vasco — declarou Pedrinho em entrevista coletiva nesta quinta-feira.
O impasse no planejamento de Lamacchia e Pedrinho é que, inicialmente, os americanos não pretendiam vender o Vasco separadamente dos demais clubes de futebol da rede, elevando assim o valor.
Uma transação dessa envergadura envolve valores significativos em duas frentes. A Crefisa teria que desembolsar um montante para compensar a 777 e também assumir integralmente as responsabilidades contratuais estipuladas quando o Vasco constituiu a SAF, incluindo os investimentos financeiros.
Outras abordagens foram feitas à SAF do Vasco nos últimos meses. Em dezembro passado, pelo menos dois intermediários distintos apresentaram à 777 interessados em adquirir os 70% do Vasco detidos pela companhia. Nenhum desses interessados era o patrocinador do Palmeiras.
Os americanos recusaram as propostas. Segundo a lógica comercial deles, seria mais vantajoso concluir a aquisição do Everton, na Inglaterra, para valorizar o grupo e depois colocar à venda a holding completa, em vez de cada clube separadamente.
Nova situação: cenário de confronto
A ação movida pelo grupo de Pedrinho na Justiça do Rio de Janeiro e a decisão judicial favorável a ele, mesmo que provisória, modificam significativamente o panorama do jogo.
Se antes havia interesse de outros agentes do mercado em adquirir a SAF do Vasco, diretamente com a 777, hoje essa possibilidade praticamente se reduziu a zero, conforme informantes consultados pela reportagem. Isso se deve à insegurança gerada pelo afastamento.
Traduzindo para termos mais simples, a insegurança se dá pelo seguinte motivo: por que um investidor compraria os 70% que supostamente pertencem à 777 se, em algum momento, esse ativo pode ser retirado por decisão judicial, mesmo que as obrigações contratuais estejam sendo cumpridas?
As opções dos americanos se limitaram à negociação com a Crefisa, que segue em andamento. Os responsáveis pela 777 nos Estados Unidos estão descontentes com a suspensão de seus direitos, e planejam contratar novos profissionais para os desdobramentos judiciais que estão por vir, retornando à mesa de negociações com um clima tenso.
A associação vascaína não acredita que o investimento previsto para setembro, de R$ 270 milhões, será concretizado pela 777 Partners. O grupo político de Pedrinho poderia ter aguardado o vencimento da parcela, que ainda tem 30 dias de prazo contratual, para então acionar a Justiça e retomar a participação acionária dos americanos.
Porém, há uma certa pressa.
Números e desafios
Um dos motivos para buscar uma resolução o mais breve possível está na chamada integralização, um termo técnico utilizado em fusões e aquisições. Em termos simples: a empresa americana adquiriu 70% da SAF do Vasco e já detém essa porcentagem desde a assinatura do acordo de acionistas com a associação. No entanto, ainda não realizou a integralização, ou seja, ainda não depositou todo o montante prometido no momento da aquisição.
Até o momento, os americanos injetaram R$ 310 milhões no caixa da SAF, correspondentes a 31% do negócio. O termo em inglês usado por eles é “cash in” (dinheiro investido), pois o montante foi destinado à própria empresa e não a terceiros.
Com o investimento programado para setembro, de R$ 270 milhões, a empresa acrescentaria mais 27% a essa conta, totalizando 58% integralizados — o que tornaria ainda mais complexo qualquer tentativa de reaver a propriedade do ativo, como estipulado em contrato.
A última parcela, de R$ 120 milhões, está prevista para vencer em setembro de 2025, correspondendo aos 12% finais para completar o montante adquirido. Neste ponto, o controle da SAF estaria mais do que garantido com a participação referente aos investimentos anteriores.
Ainda há um obstáculo importante para a resolução do embate entre a associação e os americanos: caso a 777 chegue a um acordo com um potencial investidor para a revenda de sua porcentagem na SAF, é preciso que os aportes estejam totalmente quitados ou a associação tenha que autorizar que o novo proprietário assuma as obrigações a partir do ponto onde estas forem encerradas.
A decisão de levar a disputa para o judiciário e afastar os americanos da administração da SAF, mesmo que temporariamente, tornou a situação incerta e volátil. A 777 Partners desistirá do Vasco e facilitará a negociação com a Crefisa, ou defenderá seu ativo judicialmente até o fim, buscando um valor mais elevado? Até que ponto Lamacchia está disposto a investir e arriscar para assumir o time carioca? E como Pedrinho se sairá no comando temporário da SAF com a temporada em progresso?
Fonte: ge