Um mês após sua apresentação na Colina, o jogador, então com 29 anos, deixou não só o clube, mas também o futebol. O ge se encontrou com Lobos para compartilhar a história de uma trajetória peculiar nos gramados.
Destaque do Chile
A trajetória do jogador começou de forma relativamente comum no cenário futebolístico. Nos anos 90, Frank Lobos despontava como uma das maiores promessas do Chile. Criado pelo Colo-Colo, o meio-campista ajudou a seleção chilena a conquistar o terceiro lugar no Mundial Sub-17 de 1993 e também participou da Copa do Mundo Sub-20 dois anos mais tarde.
– Frank era um excelente camisa 10 em termos técnicos, muito ágil e veloz. Apesar de baixo, compensava a falta de força com agilidade e aceleração. Ele se destacava nas seleções de base do Chile. Todos acreditavam que ele se tornaria o camisa 10 da seleção principal. Possuía um grande potencial, porém não correspondeu às expectativas – relata o jornalista chileno Samuel Ferreiro.
O ex-jogador do Vasco deu seus primeiros passos no futebol nas ruas de Santiago, sua cidade natal.
– Quando eu tinha 7 anos, um tio sugeriu que minha mãe me levasse ao melhor clube do Chile, o Colo-Colo. Minha família toda torce para o Colo-Colo – recorda Frank em entrevista ao ge.
Sua estreia no time principal ocorreu aos 15 anos. Permaneceu no Colo-Colo até o término de seu contrato, em 2000, aos 24 anos.
– Conquistei três títulos, participei das semifinais da Libertadores (1997), quando fomos eliminados pelo Cruzeiro, que contava com grandes nomes naquela geração. Tive a experiência de jogar em torneios internacionais com o clube que me viu crescer – relata o ex-meia, que complementa:
– Minha melhor lembrança foi quando conquistamos o terceiro lugar no Mundial Sub-17 com o Chile. Éramos muito jovens, sonhando em seguir no futebol. É necessário ter uma força mental para persistir, sempre digo que quem desiste não alcança o prêmio. Enfrentei decepções, mas continuei avançando, estudando, me aprimorando. O que sou hoje é fruto da educação que recebi no futebol.
O percurso antes do Vasco
Ao deixar o Colo-Colo, Frank Lobos passou por clubes de menor expressão. Inicialmente no Chile, atuou por La Serena, Everton e Deportes Concepción. Em 2001, transferiu-se para a Espanha.
– Quando joguei no Racing de Ferrol, vivenciei uma liga espanhola muito competitiva. O Atlético de Madrid estava na segunda divisão, tive a oportunidade de atuar no Vicente Calderón. Conheci uma cultura futebolística muito distinta, com treinamentos focados tanto na parte física quanto mental. Meu filho Joaquim nasceu lá e, por conta dessa vivência, ele possui cidadania espanhola.
O ex-camisa 10 também jogou no futebol japonês em 2003, defendendo o Mito Hollyhock, antes de retornar ao Chile. Esse retorno ao seu país de origem foi crucial para entender sua rápida passagem pelo Vasco.
Entre 2003 e 2005, Frank deu uma pausa em sua carreira. Retornou aos gramados atuando pelo Puerto Montt, clube do sul do Chile. Contudo, uma lesão no joelho e uma cirurgia comprometeram seu desempenho físico.
– Tive uma boa temporada pelo Puerto Montt, sendo capitão da equipe, participando de muitos minutos em campo e marcando diversos gols. Essa performance me possibilitou, por meio de contatos no mundo do futebol, ir para o Vasco.
A experiência no Vasco
Com a reconquista de sua forma no Puerto Montt, time que hoje disputa a terceira divisão chilena, Frank Lobos teve seu caminho cruzado pelo Vasco em 2006:
– Eu tinha um agente espanhol que intermediava transferências para o Vasco. Surgiu a oportunidade de eu ir e verificar se teria condições de permanecer no clube.
Assim, a passagem pelo Rio de Janeiro foi breve. Lobos não foi aprovado nos exames médicos e teve seu contrato rescindido antes mesmo de estrear. Contudo, chegou a ser apresentado pelo Vasco e passou um período treinando no clube.
– Eu estava me recuperando da cirurgia no ligamento cruzado do joelho e durante a minha estadia no Vasco, acabei me machucando. Não tive a oportunidade de me recuperar 100%, o que resultou no cancelamento do contrato. A condição era que, se eu passasse nos exames médicos, assinaria um contrato de uma temporada.
No Vasco, Frank foi treinado por Renato Gaúcho e conviveu com Romário. Apesar de não ter sido sequer relacionado para algum jogo, viveu a experiência intensamente.
– Foi enriquecedor descobrir a cultura e conviver com grandes jogadores. Renato Gaúcho sempre foi muito solícito, generoso comigo, alguém muito perspicaz. E todos os funcionários, desde o roupeiro e fisioterapeuta até a comissão técnica e jogadores, proporcionaram uma experiência maravilhosa para mim – afirma o ex-jogador, acrescentando:
– Os treinamentos eram intensos fisicamente, a medicina esportiva e a parte física eram fundamentais. Impressionante como os atletas eram preparados para as exigências físicas do futebol. Força, explosão, velocidade, resistência. O comprometimento dos jogadores era diferenciado. Além disso, a paixão da torcida do Vasco era notável, a fervorosidade dos torcedores.
A aposentadoria
Após a não concretização de sua permanência no Vasco, Frank Lobos anunciou sua aposentadoria dos gramados ao deixar o Brasil, com apenas 29 anos. A lesão teve impacto, porém o principal motivo foi um escândalo de suborno e manipulação de resultados no Chile. Inicialmente suspenso por dez anos de qualquer atividade relacionada ao futebol profissional, a Justiça posteriormente determinou sua inocência, não havendo provas de envolvimento em atividades ilícitas.
– Me vi envolvido em uma situação na qual não deveria estar, com pessoas que estavam relacionadas a apostas no futebol. Anteriormente, eu estava trabalhando em assessoria esportiva. Acabei envolvido sem querer estar naquela circunstância. Entretanto, a Justiça concluiu que eu não era culpado, não havendo evidências de que eu estivesse envolvido em atividades ilícitas.
Ressocialização de detentos
Após encerrar a carreira profissional, Lobos assumiu o comando da equipe da Penitenciária de Santiago e liderou um programa de reinserção social para detentos por meio do esporte. Além disso, fez o curso de treinador e foi certificado pelo Instituto Nacional do Futebol do Chile.
– Em 2006, iniciei meu trabalho no programa de reinserção social nas prisões do Chile, através do esporte, arte e cultura. Era uma iniciativa do Ministério da Justiça visando reduzir os índices de reincidência. Nosso objetivo era reintegrar os presos na sociedade por meio desses princípios, proporcionando ferramentas para que pudessem trabalhar após cumprir suas penas. Salvamos muitas pessoas de retornarem ao mundo do crime.
Um dos detentos com quem Frank trabalhou foi Maxim Molokoedov. O jovem russo, condenado a cinco anos de prisão por tráfico de drogas, antecipou sua liberdade para defender o Santiago Morning, equipe que disputa a segunda divisão. A contribuição do ex-jogador do Vasco foi fundamental para a ressocialização do atleta.
Padel e futebol
Apesar do fim do programa de reinserção social, Frank continuou engajado no esporte. Com sua certificação de treinador, ele atua atualmente na “Santa Elena Soccer and Padel”, escola pertencente a Mauricio Castro.
– Mauricio é um grande amigo e está frequentemente no Brasil. Atualmente possuímos 12 unidades no Chile, onde ensinamos futebol, inclusive para crianças em situação de vulnerabilidade social, intervindo durante a pré-adolescência para evitar o envolvimento com o crime e as drogas. Contamos com campos de futebol, quadras de padel e toda a estrutura necessária para a prática esportiva. Também possuo o curso internacional de padel.
De volta ao Chile, Frank Lobos guarda com carinho as lembranças do Vasco e torce para que seu ídolo e compatriota Gary Medel represente bem o Chile no futebol brasileiro.
– Conheci muito bem o Medel, um jogador notável que dedicou sua vida ao futebol. É extremamente inteligente, contribuiu significativamente para a história do futebol chileno e internacional. É uma figura importante para o Chile. Um verdadeiro guerreiro, estou orgulhoso por vê-lo defendendo as cores do Vasco. Todos nós somos vascaínos – conclui Frank.
Fonte: ge