Ao longo do tempo, 10 cidadãos do Chile atuaram pelo Vasco, porém nem todos deixaram marcas. Em 2006, o armador Frank Lobos teve uma breve estada em São Januário, na qual sequer chegou a participar de uma partida oficial.
30 dias após sua apresentação na Colina, o atleta, então com 29 anos, saiu não apenas do clube, mas também do futebol. O ge conversou com Lobos para relatar a narrativa de um percurso peculiar nos campos.
Frank Lobos explica sua chegada ao Vasco em 2006
Despontando no Chile
A trajetória teve início de maneira comum no cenário futebolístico de elite. Nos anos 90, Frank Lobos despontava como uma das grandes promessas do Chile. Formado no Colo-Colo, o armador contribuiu para a seleção chilena conquistar o terceiro lugar no Mundial Sub-17 de 1993. Também esteve presente na Copa do Mundo Sub-20 dois anos mais tarde.
– Frank era um meia 10 com excelentes habilidades técnicas, muita velocidade. Baixo, compensava a falta de força com agilidade e aceleração. Destacava-se nas seleções de base do Chile. Todos previam que seria o camisa 10 da seleção principal. Possuía grande potencial, porém não correspondeu às expectativas – relata o jornalista chileno Samuel Ferreiro.
O ex-jogador do Vasco deu os primeiros passos no futebol nas ruas de Santiago, sua cidade natal.
– Aos 7 anos, um tio aconselhou minha mãe a me levar ao mais renomado clube do Chile, o Colo-Colo. Minha família toda apoia o Colo-Colo – relembra Frank em entrevista ao ge.
Sua estreia no time principal aconteceu aos 15 anos. Permaneceu no Colo-Colo até o término de seu contrato, em 2000, aos 24 anos.
– Conquistei três títulos, disputei a semifinal da Libertadores (1997), quando fomos eliminados pelo Cruzeiro de grandes nomes daquela geração. Experimentei torneios internacionais com o clube que me viu crescer – conta o ex-meia, completando:
– Minha memória mais marcante é o terceiro lugar no Mundial Sub-17 com o Chile. Éramos muito jovens, sonhando em seguir no futebol. É preciso ter uma mente forte para persistir, costumo dizer que quem desiste não alcança o prêmio. Enfrentei decepções, porém continuei avançando, estudando, me profissionalizando. O que sou hoje se deve à formação que recebi no futebol.
O percurso anterior ao Vasco
Ao deixar o Colo-Colo, Frank passou por clubes de menor expressão. Inicialmente no Chile, atuou por La Serena, Everton e Deportes Concepción. Em 2001, transferiu-se para a Espanha.
– Minha passagem pelo Racing de Ferrol na liga espanhola foi bastante proveitosa. O Atlético de Madrid estava na segunda divisão, tive a oportunidade de jogar no Vicente Calderón. Também descobri uma mentalidade muito distinta no futebol, treinamentos, aspectos físicos e mentais. Meu filho Joaquim nasceu lá e, graças a essa vivência, ele é cidadão espanhol.
O ex-camisa 10 também jogou na liga japonesa em 2003, pelo Mito Hollyhock, antes de retornar ao Chile. Esse retorno foi determinante para compreender a rápida passagem pelo Vasco.
Entre 2003 e 2005, houve uma pausa na carreira de Frank. Retornou ao campo pelo Puerto Montt, equipe do sul do Chile. Lesionou o joelho, passou por cirurgia e não estava em boa forma física.
– Tive um ótimo desempenho pelo Puerto Montt, era capitão do time, muitos minutos em campo, diversos gols marcados. Isso abriu portas, por meio de contatos no meio futebolístico, para minha ida ao Vasco.
A chegada ao Vasco
Após se reerguer no Puerto Montt, equipe que hoje disputa a terceira divisão chilena, Frank Lobos cruzou caminhos com o Vasco em 2006:
– Um agente espanhol, que levava atletas ao Vasco, intermediou minha ida. Surgiu a oportunidade de ser avaliado e verificar se estava em condições de permanecer.
Frank Lobos relembra os treinamentos no Vasco
Dessa forma, sua passagem pelo Rio de Janeiro foi breve. Lobos não passou nos exames médicos e teve o contrato rescindido antes mesmo de estrear. No entanto, foi apresentado pelo Vasco e teve um período de treinamento no clube.
– Estava me recuperando da cirurgia no ligamento cruzado do joelho e, durante meu tempo no Vasco, me lesionei. Não tive a oportunidade de me restabelecer totalmente, o que resultou no cancelamento do contrato. Estava acordado que, se passasse nos exames médicos, assinaria contrato de uma temporada.
No Vasco, Frank foi treinado por Renato Gaúcho e teve contato com Romário. Mesmo sem ter sido relacionado para nenhum jogo, viveu intensamente a experiência.
– Foi enriquecedor vivenciar a cultura e conviver com grandes atletas. Renato Gaúcho sempre foi muito amável, generoso comigo, um indivíduo muito perspicaz. E todos os funcionários, do roupeiro ao fisioterapeuta, da comissão técnica aos atletas, uma experiência incrível para mim – relata o ex-jogador, acrescentando:
– Os treinamentos eram muito intensos em termos físicos, a medicina esportiva e a parte física eram essenciais. Impressionante como preparavam os atletas para as exigências físicas. Força, explosão, velocidade, resistência. O comprometimento dos jogadores era diferente. Magnífico também era o apoio da torcida do Vasco, a paixão dos torcedores.
A aposentadoria
Após não obter sucesso no Vasco, Frank Lobos anunciou sua retirada dos gramados ao deixar o Brasil, com apenas 29 anos. A lesão teve influência, mas o motivo principal foi um escândalo de suborno e manipulação de resultados no Chile. Inicialmente, foi proibido de exercer qualquer atividade relacionada ao futebol profissional por dez anos.
– Me vi envolvido por circunstâncias inadequadas, com pessoas envolvidas em apostas de futebol. Cumpria funções em consultoria esportiva. Acabei me envolvendo sem intenção. Porém, a Justiça determinou que eu não era culpado, que não havia provas de irregularidades em minhas ações.
Ressocialização de reclusos
Após encerrar a carreira profissional, Lobos treinou a equipe da Penitenciária de Santiago e liderou um programa de reintegração social para detentos por meio do esporte. Também obteve o título de treinador e foi certificado pelo Instituto Nacional do Futebol do Chile.
– Em 2006, iniciei minha atuação em um programa de reintegração social, por meio do esporte, arte e cultura, nas prisões chilenas. Era um projeto do Ministério da Justiça visando reduzir índices de reincidência. Reintegrar os prisioneiros na sociedade por meio desses princípios, proporcionar ferramentas para que pudessem se inserir no mercado de trabalho após cumprirem suas penas. Fizemos a diferença na vida de diversas pessoas, evitando seu retorno ao crime.
Um dos detentos com quem Frank colaborou foi Maxim Molokoedov. O jovem russo, preso por tráfico de drogas e sentenciado a cinco anos, conseguiu antecipar sua liberdade para jogar pelo Santiago Morning, equipe da segunda divisão. O ex-jogador do Vasco foi crucial em sua reabilitação.
Padel e futebol
Após o término do programa de reintegração social, Frank continuou atuando no campo esportivo. Credenciado como treinador, atualmente trabalha na “Santa Elena Soccer and Padel”, escola pertencente a Mauricio Castro.
– Mauricio é um amigo fiel, sempre presente no Brasil. Atualmente, temos 12 escolas no Chile, nas quais ensinamos futebol, inclusive para crianças em situação de vulnerabilidade social, visando prevenir a criminalidade e o consumo de drogas. Contamos com campos de futebol e quadras de padel, oferecendo toda a estrutura para a prática esportiva. Além disso, possuo certificação internacional em padel.
Frank Lobos elogia Medel, capitão do Vasco
Do Chile, Frank Lobos guarda com carinho as recordações do Vasco e torce para que o ídolo e compatriota Gary Medel represente bem o Chile no futebol brasileiro.
– Conheço bem o Medel, um tremendo atleta, dedicou sua vida ao esporte. Muito inteligente, contribuiu significativamente para a história do futebol chileno e internacional. É uma liderança importante para o Chile. Um verdadeiro guerreiro, sinto orgulho de vê-lo defendendo as cores do Vasco. Somos todos vascaínos – conclui Frank.
Fonte: ge