“Eu chegava em casa e achava que não sabia mais jogar futebol”.
Essa frase é de Andrey Santos, de 23 anos, que, atualmente, integra a seleção brasileira e faz parte do elenco do Chelsea. Ele conseguiu superar um início difícil na Inglaterra. Revelado nas categorias de base do Vasco, o meia passou os últimos anos emprestado a outros clubes até finalmente se sentir parte efetiva dos Blues. Seu bom momento é culminado com a titularidade na Seleção, em uma partida contra a Bolívia, marcada para as 20h30 em El Alto, pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2026.
— Cheguei muito jovem (início de 2023), fui direto para a pré-temporada com o Chelsea, e foi um choque de realidade. A rotação aqui é totalmente diferente. Eu chegava em casa pensando que não sabia jogar bola devido à intensidade e ao ritmo de jogo. Fui bem na pré-temporada, mas optei por ser emprestado. Infelizmente, não joguei também. Foi um processo complicado, mas amadureci bastante — declarou Andrey ao ge.
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Andrey Santos, meia do Chelsea, em entrevista ao ge em Londres — Foto: Ana Canhedo
Andrey ingressou no Chelsea aos 18 anos, em janeiro de 2023. Dois meses depois, foi emprestado ao Vasco até junho. Retornou à Inglaterra no meio do ano e participou da pré-temporada com os Blues, porém, foi novamente emprestado, desta vez para o Nottingham Forest.
Lá, também não conseguiu ter oportunidades.
— Todo jogador que chega cedo na Europa acaba enfrentando dificuldades. Acredito que foi um processo de adaptação. Tentei manter a mente equilibrada, independentemente do clube. O mais desafiador foi a falta de jogos. Treinos e partidas são de alta intensidade o tempo todo. Após dois ou três meses, a adaptação ao ritmo inglês acontece. A ficha cai e começamos a mostrar nosso verdadeiro potencial. Agora, me sinto adaptado.
— Na base do Vasco, eu jogava, era capitão, ia para a Seleção. Fui emprestado a um time menos expressivo e, mesmo assim, não joguei. Foi muito difícil. Eu e minha esposa éramos novos e estávamos sozinhos aqui. Foram seis meses duros, mas que serviram para meu aprendizado — relembrou.
Andrey Santos com a esposa, Yngryd, no Stanford Bridge, a casa do Chelsea — Foto: Acervo pessoal
“A melhor temporada da minha vida”
Após o breve período no Nottingham, Andrey novamente não recebeu oportunidades no Chelsea e seguiu seu caminho no futebol francês. Foi no segundo empréstimo, ao Strasbourg, na metade final do ano passado, que sua carreira deslanchou. Ele permaneceu lá até junho deste ano.
Em 39 partidas no Campeonato Francês, balançou as redes 10 vezes e registrou três assistências. Finalmente, encontrou a alegria de jogar na Europa.
— Lembro que foram dadas opções e, após conversar com minha esposa, decidimos retornar à França, pois na primeira parte do empréstimo foram apenas 12 jogos. Eu estava em grande forma, me senti acolhido pela equipe, comissão técnica e torcida. Foi uma temporada excepcional, a melhor da minha vida e a primeira completa na Europa. Fiz gols, fui feliz e cheguei à Seleção.
Andrey Santos com a camisa do Strasbourg, da França — Foto: Getty Images
Durante a fase final do empréstimo ao time francês, ele alcançou uma impressionante sequência de 17 jogos sem ser substituído. Esses números obviamente chamaram a atenção do Chelsea e, principalmente, da seleção brasileira, resultando em duas convocações seguidas a um ano da Copa do Mundo.
— Na França, o Chelsea também me ofereceu todo o suporte. Eles deixaram claro que meu objetivo era ganhar minutos. A cada dois meses, alguém vinha me visitar. Scouts e diretores sempre trocavam mensagens, o que me fez sentir parte do projeto — completou.
Projeto Londres
O projeto era, de fato, retornar ao Chelsea. O tão desejado retorno ocorreu durante a Copa do Mundo de Clubes, onde foi notificado que fazia parte dos planos para a temporada 2025/26. Ele participou de quatro jogos da recompensadora campanha, que resultou no título mundial para o clube.
Embora tenha enfrentado desafios e dificuldades, Andrey não se arrepende de ter deixado o Brasil tão cedo.
— Minha escolha foi acertada porque todo jogador almeja jogar na Europa. Imagine receber uma proposta de um dos maiores clubes do mundo, com condições financeiras para resolver sua vida e de sua família. É impensável recusar. Eu sabia que o processo seria desafiador. Muitos me alertaram sobre isso. Vi outros casos, como os de Vinicius e Rodrygo, que também passaram por dificuldades. Compreendia que isso poderia acontecer. Porém, não se diz não ao Chelsea. Não me arrependo de nada e estou muito feliz — opinou Andrey, que agora é pai de um garoto, Anthony, de seis meses.
Diferentemente de João Pedro e Estêvão, que têm sido titulares no início da temporada inglesa, Andrey tem conquistado espaço lentamente, participando de todas as partidas da Premier League até o momento.
Foco na Copa do Mundo
Convocado novamente por Carlo Ancelotti, Andrey ainda busca um novo lar em Londres para viver com seu filho e esposa. Mesmo morando em um hotel fornecido pelo Chelsea, ele mudou alguns hábitos visando aprimorar sua forma física.
— Cada detalhe é crucial no futebol europeu. Apenas talento não é suficiente; é necessário fazer algo a mais. Sinto que evoluí bastante fisicamente desde a época do Vasco. Ficou mais forte e veloz. Tomei a decisão de mudar e agora conto com fisioterapeuta, chef de cozinha, nutricionista e um estafe que me apoia. Cada detalhe pode determinar seu sucesso ou fracasso — contou, orgulhoso.
Andrey foi o capitão da seleção brasileira olímpica — Foto: Mohamed Bissar/CBF
Andrey foi o capitão da seleção brasileira olímpica — Foto: Mohamed Bissar/CBF
— Sempre tive uma linda trajetória na Seleção desde pequeno. Chegar à principal é um sonho realizado. Estou ciente de que a Copa do Mundo está próxima e por isso preciso manter o foco no Chelsea, desempenhando um papel vital e garantido na lista de convocados. A Copa do Mundo é o meu maior sonho.
Vasco no coração
Andrey, nascido em Vila Aliança, uma comunidade carioca em Bangu, mantém suas raízes. Ele participou de todas as categorias de base no Vasco e guarda o clube no coração. Apesar de um começo difícil devido a questões financeiras, sua história é brilhante pela chance recebida no clube.
— Tive uma infância difícil, sem muitos recursos. Enquanto meus pais estavam em uma festa, um amigo meu, Marlon, hoje na Ucrânia, foi visto jogando. Uma semana depois, fui colocado na escolinha do Bangu para emagrecer. Minha avó também sempre apoiou meu sonho. Com seis anos, joguei um campeonato contra o Vasco, que me convidou para me integrar.
— Dada a nossa realidade precária, era complicado fazer a viagem de ida e volta. Meu pai disse que seria um projeto por apenas seis meses, mas como era meu sonho, cumpriu. Fui muito bem recebido, o que me incentivou, e meus pais tiveram um papel essencial. Não é fácil sair de uma comunidade onde seus pais abrem mão de suas escolhas para fazer meu sonho se tornar realidade. Sou extremamente grato a eles e ao Vasco.
Andrey fez toda a categoria de base no Vasco — Foto: Daniel Ramalho / Vasco
As dificuldades na comunidade o fizeram, inclusive, perder treinos.
— Por vezes, não conseguia sair de casa devido a tiroteios, não havia dinheiro para a passagem ou para comprar um lanche. Também precisei equilibrar a escola, o que foi desafiador.
Atualmente feliz na Europa, Andrey planeja criar seu filho em Londres. O retorno ao Brasil, por ora, não está no horizonte, mas ele sabe que um dia isso voltará a acontecer.
— Sim, no futuro, desejo voltar ao meu lugar de origem, ao clube que me proporcionou tudo. No entanto, estou satisfeito aqui na Europa e quero criar o Anthony por aqui.
Fonte: ge