Em entrevista ao Abre Aspas, Vagner Love compartilhou detalhes de sua carreira, falou sobre sua vivência em diferentes culturas, de China ao Cazaquistão, destacou as peculiaridades das torcidas de Flamengo e Corinthians, e relembrou momentos marcantes em clubes como Palmeiras. Dispensado por Vasco e São Paulo, o atacante revela sentir uma motivação extra ao enfrentar essas equipes.
Bicampeão da Copa América pela Seleção, Vagner Love aponta Endrick como o nome ideal para assumir a camisa 9 da equipe nacional, e já projeta a presença de Estêvão na próxima Copa do Mundo.
Ficha técnica:
Nome completo: Vagner Silva de Souza
Nascimento: 11 de junho de 1984
Clubes por onde passou: Palmeiras, CSKA Moscou, Flamengo, Shandong Luneng, Corinthians, Monaco, Alanyaspor, Beşiktaş, Kairat, Midtjylland, Sport e Atlético-GO.
Principais conquistas: bicampeão da Copa América pela Seleção (2004 e 2007); Copa da UEFA (2004/05); tricampeão do Campeonato Russo (2005, 2006 e 2012/13); hexacampeão da Copa da Rússia (2004/05, 2005/06, 2007/08, 2008/09, 2010/11 e 2012/13) pelo CSKA; Campeão Brasileiro (2015) e Paulista (2019) pelo Corinthians; campeão estadual pelo Sport (2023) e Atlético-GO (2024); além do Campeonato Cazaque (2020) pelo Kairat e da Copa da China (2014) pelo Shandong, entre outros títulos.
ge: A proximidade de completar 40 anos lhe traz qual sentimento?
Vagner Love: – Me sinto feliz. É uma alegria enorme poder continuar jogando futebol aos 40 anos, desfrutando do esporte e mantendo a saúde. Nunca imaginei que chegaria a essa idade ainda em campo, e sinto que Deus me permite isso. Cada treino, cada jogo é uma emoção renovada, como se fosse o início da carreira novamente. Enquanto tiver disposição e meu corpo corresponder, pretendo seguir jogando e aproveitando cada momento. Tenho consciência de que o fim se aproxima, mas enquanto puder, desejo prolongar essa experiência e desfrutar ao máximo.
O que continua te motivando a seguir jogando?
– A paixão pelo futebol. Desde criança sou apaixonado pelo esporte. Essa paixão me move, me proporciona aquele frio na barriga antes dos jogos, a possibilidade de disputar finais e almejar títulos.
Apesar das inúmeras conquistas, ainda sente a mesma fome de vitórias?
– Sim, tenho essa fome constante de conquistas, de sempre buscar algo a mais. Enquanto acordar motivado para os treinos e jogos, sentindo a vontade de competir e vencer, continuarei em busca de novos desafios. É um privilégio poder desfrutar desse dom que Deus me deu e quero aproveitar ao máximo cada momento em campo, buscando sempre superar meus limites.
Com o avançar da idade, você enfrenta mais desafios físicos?
– Graças a Deus, tenho uma genética favorável e tenho me cuidado mais nos últimos anos. O futebol evoluiu em termos de recuperação e tratamentos, e eu também tenho me dedicado mais. Mesmo nas férias, continuo treinando para estar preparado na pré-temporada e reduzir possíveis desconfortos. A idade avançada exige que eu mantenha a forma durante todo o ano, e essa dedicação tem sido fundamental para lidar com as demandas físicas da temporada.
Quando percebeu a importância de se cuidar mais?
– Recebi um conselho de um amigo fisioterapeuta ainda na minha passagem pelo CSKA, em 2005. Ele alertou para a necessidade de priorizar os cuidados com o corpo, e essa orientação se mostrou essencial ao longo dos anos. Foi somente quando retornei ao Corinthians, em 2015, que senti na prática a importância desse cuidado. Desde então, tenho mantido uma rotina mais disciplinada, atenta à alimentação, descanso e treinamento constante.
Não sente a tentação de relaxar diante das conquistas e pensar que não precisa mais se esforçar?
– Sempre há essa tentação, porém a paixão pelo esporte supera qualquer conforto. Se um dia acordar sem vontade de treinar, será o momento de parar. Enquanto persistir a alegria e a motivação de jogar, seguirei empenhado em desfrutar ao máximo essa oportunidade. Cada treino, cada partida é um privilégio que pretendo aproveitar ao máximo.
E sobre a transição para a carreira de treinador, como enxerga essa possibilidade?
– Vejo a carreira de treinador como desafiadora, que demanda estudo, dedicação e concentração semelhantes à carreira de jogador. Ainda não decidi qual caminho seguir após encerrar a trajetória nos gramados, mas considero a possibilidade de explorar novas atividades, como a culinária, por exemplo, como uma forma de buscar experiências diferentes e diversificar meus interesses.
Já pensou em seguir no futebol fora das quatro linhas, atuando como empresário, por exemplo?
– É uma das opções que considero. Meu empresário, Evandro Ferreira, já brinca que eu serei seu substituto. A possibilidade de trabalhar com jogadores, compartilhar minha história e vivências no futebol é algo que me atrai. A experiência adquirida ao longo dos anos me permite orientar os jovens e auxiliá-los em suas trajetórias, transmitindo conhecimento e conselhos para que alcancem seus objetivos.
A qual treinador você se sentiu mais conectado durante sua carreira?
– Destaco o Tite, pelo Corinthians, como um dos treinadores com quem tive uma ótima relação, principalmente pela gestão do grupo. Além dele, destaco também Dunga, na Seleção Brasileira, e Dorival Júnior, como profissionais que admiro e que considero como referências em termos de gestão, treinamentos e relacionamento com os jogadores.
Como é sua relação com Jair Ventura, técnico do Atlético-GO, que inclui até mesmo o famoso beijinho na careca?
– Há uma ótima relação com Jair Ventura, que demonstra boas ideias e gestão coerente. Em uma ocasião, ele me desafiou a marcar um gol e prometeu um beijo na careca. Quando isso aconteceu, cumpriu com sua promessa. É um profissional competente que ainda tem muito a crescer no cenário do futebol brasileiro.
Entre os clubes por onde passou, qual deles você se sente mais identificado?
– Sem dúvidas, o CSKA. Foi onde permaneci por mais tempo e conquistei diversos títulos, inclusive a Liga Europa. Apesar disso, guardo carinho e respeito por todos os clubes por onde passei, como o Palmeiras, que foi onde iniciei minha carreira, e o Corinthians, que também marcou minha trajetória com importantes conquistas.
Pode falar um pouco sobre a peculiaridade das torcidas de Flamengo e Corinthians?
– A torcida corintiana se destaca pela incessante vibração, apoiando o time em todos os momentos, até mesmo nos momentos adversos. Já a torcida flamenguista costuma fazer festas grandiosas em caso de vitória, porém pode se mostrar mais exigente e crítica em situações de derrota. Ambas possuem características singulares que as diferenciam e refletem a paixão do brasileiro pelo futebol.
Qual sua opinião sobre os desafios e pressões enfrentadas pelos treinadores no futebol atual?
– A vida de treinador no Brasil é intensa e desafiadora. Lidar com um elenco numeroso, administrar as expectativas dos jogadores, garantir um desempenho consistente em meio a uma rotina de cobranças constantes dos resultados gera uma pressão elevada. O relacionamento com o grupo é crucial, assim como a coerência, transparência e comprometimento do treinador são fundamentais para obter sucesso no comando de uma equipe.
Como você enxerga o papel da torcida no futebol brasileiro e o impacto das redes sociais na relação jogador-torcedor?
– A presença e o apoio da torcida são essenciais para o estímulo e o desempenho dos jogadores dentro de campo. No entanto, comportamentos negativos, como agressões físicas ou ofensas nas redes sociais, não condizem com o espírito esportivo. A violência e a intolerância devem ser combatidas, visando preservar o respeito e a harmonia no ambiente esportivo.
Houve algum comentário que tenha lhe chateado ao longo da carreira?
– Certa vez, um comentário feito por André Rizek comparando minhas habilidades com as de um jogador lesionado me impactou negativamente. Comentários desse tipo podem afetar não só o atleta, mas também sua família e entorno. Acredito na importância da crítica construtiva, porém, manifestações pejorativas ou desrespeitosas não contribuem para um ambiente saudável no esporte.
Como lidou com situações de mágoa ou adversidades ao longo de sua carreira?
– Procuro não cultivar mágoas, pois a resiliência e a gratidão são valores que prezo. Apesar de vivenciar desafios e críticas ao longo da trajetória, busco focar nas experiências positivas e manter a serenidade frente a situações desafiadoras. O apoio da família, dos amigos e a gratidão pelas oportunidades vivenciadas são elementos essenciais para superar dificuldades e seguir em frente com determinação.
Quais foram os companheiros de equipe com os quais você mais se identificou em campo?
– Jô, Ronaldinho, Daniel Carvalho, Edmilson e Diego Souza são alguns dos jogadores com os quais estabeleci uma forte conexão em campo. A sintonia e a compreensão mútua no jogo foram fundamentais para o sucesso do time e para minha própria performance. É a harmonia e o espírito de equipe que determinam os bons resultados em campo.
Considerando sua experiência no futebol, algum conselho ou observação sobre a nova geração de jogadores brasileiros?
– Vejo em Endrick um talento promissor e determinado. Acredito que ele tem potencial para se destacar, especialmente pelos atributos físicos e técnicos que vem demonstrando. Seu profissionalismo e foco são dignos de destaque e o credenciam como uma promessa para a Seleção Brasileira. Também vejo em Estêvão um jogador com potencial para integrar a equipe nacional, unindo talento e dedicação aos treinos e jogos.
Na sua opinião, o que torna Endrick tão especial?
– Endrick se destaca não apenas por seu desempenho em campo, mas também pela personalidade, maturidade e capacidade de assumir responsabilidades em momentos decisivos. Assim como grandes jogadores do passado, Endrick demonstra a confiança e a determinação necessárias para assumir o protagonismo e contribuir de forma significativa para sua equipe.
Em relação à carreira no futebol, quais foram as principais mudanças que você observou desde que começou?
– A velocidade e a intensidade do jogo aumentaram consideravelmente ao longo dos anos. Atualmente, a exigência física e a dinâmica das partidas são muito maiores, demandando dos jogadores um alto nível de preparo e resistência. A evolução do futebol trouxe um jogo mais acelerado e competitivo, com poucos momentos de pausa e maior exigência técnica dos atletas.
Entre os países onde viveu, qual foi o mais marcante para você?
– A Turquia me surpreendeu de forma positiva pela cultura, culinária e ambiente acolhedor. A passagem pela cidade de Erne, na Dinamarca, foi desafiadora devido às condições climáticas e à tranquilidade do local. Cada país possui suas particularidades e experiências únicas, mas a Turquia se destacou como um lugar especial para viver.
Se pudesse mudar algo no futebol brasileiro, o que alteraria?
– Buscaria estabelecer um calendário mais equilibrado e menos desgastante para os jogadores, visando preservar a saúde física e mental dos atletas. A redução da sobrecarga de jogos e competições poderia contribuir para um desempenho mais consistente e duradouro dos profissionais, além de proporcionar mais tempo para o convívio familiar e o descanso necessário para um rendimento ótimo.
Fonte: ge