No universo da educação, há algo que o caracteriza como singular.
Essa foi a declaração de Paulo Roberto Santos ao descrever as particularidades do Colégio Vasco da Gama, que completou duas décadas em 2024. A instituição se destaca por diversas razões: ex-alunos renomados, flexibilidade de horários e regras adaptadas à rotina esportiva, além da oportunidade de assistir a um jogo da Champions League durante o período escolar.
Desde sua fundação, em março de 2004, a proposta sempre foi facilitar a vida dos jovens atletas, que precisam conciliar os estudos com suas carreiras esportivas. A ideia é proporcionar um ambiente que integre estudo, residência e treinamento no mesmo local. Ao longo dos anos, a escola passou por diferentes fases e, atualmente, conta com uma administração voltada para o esporte e o cuidado individualizado.
A instituição já acolheu mais de cinco mil atletas ao longo de sua trajetória e atualmente atende a 140 estudantes, do 6º ano ao 3º ano do Ensino Médio. O único requisito para ingressar é ser um atleta do Vasco da Gama. Embora aceite todos os esportes, a maioria dos alunos são jogadores de futebol masculino; apenas duas alunas integram a natação e estão no sétimo ano.
Gestão
O colégio está localizado nas dependências de São Januário, próximo à capela, e tem vista para o campo do estádio. A administração está sob responsabilidade do clube, presidido por Pedrinho, enquanto a parte financeira é gerida pela SAF da 777 Partners.
Assim como em qualquer escola tradicional, há professores de diversas disciplinas, funcionários de apoio e equipe administrativa. Sobre o corpo docente, o diretor destaca que ser torcedor do Vasco não é um requisito, mas reconhece que há uma identificação maior com a história do clube.
Paulo Roberto trocou a direção de uma escola pública no Rio para assumir a gestão do Colégio Vasco há um ano. Desde então, melhorias foram implementadas nas instalações, e em breve serão adicionados um estúdio e uma sala de TV. O objetivo é tornar o ambiente mais acolhedor e agradável para os alunos, indo além do tradicional espaço de aulas e provas.
Em 2019, o portal ge reportou uma crise financeira na instituição, com greves de professores, atrasos salariais e escassez de materiais. Questionado sobre a situação atual das contas, Paulo assegura que não há mais déficits e que os problemas financeiros já fazem parte do passado.
Ensino personalizado e visão de futuro
Um dos pontos de destaque da escola é o acolhimento, conforme destaca a professora de Língua Portuguesa, Etiene Oliveira. Isso se deve ao fato de receber atletas de diversas origens, muitos vindos sozinhos de outras regiões em busca do sonho de se tornarem profissionais no Vasco.
Ao ingressarem, os alunos passam por uma avaliação para identificar suas necessidades, dificuldades e contextos individuais. A partir dessas informações e em diálogo com suas famílias, a escola desenvolve um método de ensino personalizado, incluindo aulas particulares, se necessário.
Outro diferencial importante destacado pelos coordenadores é a preocupação em abordar questões relevantes da sociedade. Etiene explica que a intenção é que temas sociais significativos, parte da história do Vasco, façam parte do cotidiano dos alunos, não se restringindo a datas comemorativas.
Um dos temas recentes abordados em aula foi o das apostas esportivas. A escola considera essencial que os estudantes, também sendo atletas, compreendam a complexidade por trás desse tema e reflitam sobre a decisão de participar desses jogos, mesmo em fases iniciais de suas carreiras esportivas.
Olhando para o futuro, Paulo questiona: “O que desejamos para o Vasco e para a escola daqui para frente?”. A abordagem visa preparar os alunos para os desafios que estarão por vir.
Didática esportiva
No Colégio Vasco, o esporte não é apenas uma atividade extracurricular. A instituição busca integrar o esporte à rotina e ao material educacional, principalmente o futebol, predominante entre os alunos.
“Se um estudante vai aprender sobre a geografia da Europa, queremos que entenda a partir da Champions League, das ligas europeias. Se a professora de Português vai analisar um texto, buscamos referências em Nelson Sargento, vascaíno que discorre sobre comunidade. Quando o professor de Matemática resolve um problema, usamos o Estádio de São Januário, números e fotos como base”, detalha Paulo.
O colégio permite algumas flexibilidades incomuns em outras instituições de ensino. Por exemplo, em dias de jogos da Champions League, algumas aulas são interrompidas para que os alunos possam acompanhar as partidas. Além disso, em situações de treinos intensos, é permitido o uso de chinelos ao invés de tênis.
Em caso de eventos especiais, como a estreia no time profissional ou uma partida muito desgastante, as datas de provas são reagendadas para garantir que o aluno esteja preparado e concentrado. A coordenação não deseja que um estudante seja reprovado por não conseguir cumprir os requisitos devido às demandas da carreira esportiva.
O diretor ressalta que não se trata de “regalias”, mas sim de compreensão de que esses estudantes não são apenas atletas, são profissionais do esporte. A escola busca tornar mais leve a árdua rotina desses jovens.
Além disso, está em desenvolvimento um material educativo que aborda o esporte e o Vasco como temática central nas disciplinas. A proposta é que os alunos assimilem os conteúdos a partir de suas realidades e estabeleçam associações para favorecer a aprendizagem.
O material em produção abordará o esporte de forma abrangente, destacando ídolos do futebol, com destaque para Roberto Dinamite e outros personagens relevantes da história do Vasco.
Do colégio para o mundo
Entre os inúmeros estudantes que passaram pelo Colégio Vasco da Gama, diversos tornaram-se figuras reconhecidas no mundo do futebol.
Nomes como Alex Teixeira, Allan Kardec, Souza, Paulinho, Douglas Luiz, Phillipe Coutinho, Jordi, Gabriel Félix, Alan Cardoso, Henrique, Luan Garcia, Marlon Gomes, Andrey, Eguinaldo, Bruno Gallo, Guilherme Costa, Mateus Vital e Talles Magno figuram na extensa lista de ex-alunos.
No aniversário de duas décadas da escola, três desses ex-alunos prestaram homenagem à instituição nas redes sociais do clube.
Etiene ministrou aulas para Talles Magno, Eguinaldo e JP, que estreou no time profissional na vitória contra o Grêmio, por 2 a 1, na abertura do Brasileirão. Ela relata a rapidez com que a vida dos alunos se transforma – de um dia para o outro, passam de estudantes a participantes de competições de alto nível.
No caso de Talles, por exemplo, Etiene lembra que ele perdeu várias avaliações devido às viagens com a equipe principal logo após ser promovido da base. A solução foi condensar os testes para que conseguisse cumprir suas obrigações escolares sem prejudicar seu compromisso com o time.
O colégio também se preocupa com a saúde mental dos atletas, buscando conscientizá-los da realidade desafiadora das carreiras esportivas, em que nem todos atingem o sucesso esperado. Incentiva-se a participação dos alunos em processos seletivos e explora-se outras possibilidades além da carreira esportiva.
Fonte: ge