Mesmo repetindo diversas vezes a expressão “Não posso comentar” durante a coletiva de imprensa realizada na quarta-feira, Pedrinho conseguiu demonstrar claramente sua insatisfação com a SAF ao longo de mais de 1 hora e 20 minutos de conversa com os jornalistas. As declarações do presidente revelaram que o clube associativo enfrenta uma crise com a empresa responsável pelo controle do futebol do Vasco.
No entanto, esta não é a primeira vez. A entrevista se tornou apenas mais um capítulo de uma relação que, apesar de recente, já passou por momentos turbulentos entre o clube associativo e a SAF.
Desde a concretização da venda do futebol, em setembro de 2022, alguns conflitos marcaram o relacionamento entre a associação e a SAF. Abaixo, o ge relembra os acontecimentos:
Desentendimento com antigo CEO
A primeira crise entre o clube e a empresa teve início poucos meses após a 777 assumir o controle do Vasco. A controvérsia tinha um nome e sobrenome: Luiz Mello, ex-CEO da SAF.
Antes de se tornar a figura principal da 777 no Vasco, Mello já exercia a função de CEO do clube. Ele esteve envolvido nas principais decisões desde o início de 2021, participando ativamente da transição para o modelo empresarial e ganhando destaque com a chegada dos investidores americanos, o que gerou conflitos com membros da associação.
O então presidente Jorge Salgado, pressionado por vice-presidentes da gestão anterior, havia decidido demitir Luiz Mello quando a 777 o nomeou como CEO da SAF. O clube expressou sua insatisfação com a empresa, que optou por manter o diretor.
Em 2023, com o início conturbado no Campeonato Brasileiro, a associação passou a criticar Mello com mais frequência perante a 777. A pressão que era interna se ampliou com a insatisfação dos torcedores. As dívidas com clubes e empresários, contraídas nas negociações de jogadores, foram atribuídas ao dirigente.
No meio do ano passado, após muitas discussões nos bastidores, o clube intensificou as cobranças em relação a Luiz Mello. Não havia clima para sua continuidade no Vasco, e o CEO recebeu um convite da 777 Partners para ocupar um cargo no grupo internacionalmente.
O caminho seguido por Jorge Salgado e seus aliados foi levar as preocupações às reuniões do Conselho de Administração da SAF. A pressão surtiu efeito e, naquele momento, houve uma melhora na relação com a efetivação de Lúcio Barbosa, antes diretor financeiro, como novo CEO.
Atraso no repasse do investimento
Com a saída de Mello, o Vasco associativo e a SAF viveram um breve período de trégua na ainda jovem parceria. Contudo, não demorou para surgir um novo impasse. No segundo semestre do ano passado, a 777 Partners atrasou o repasse financeiro previsto em contrato para a SAF. O montante, cerca de R$ 100 milhões, deveria ter sido creditado na conta do clube até 5 de setembro, com um prazo adicional de 30 dias, sendo 5 de outubro a data limite.
Nos momentos finais do prazo, na noite de 5 de outubro, a 777 informou ao Vasco que havia efetuado uma parte do pagamento, prometendo a quitação do restante nos dias subsequentes. E assim foi feito. No entanto, o atraso gerou desconforto no clube, levando Jorge Salgado a cogitar uma notificação à empresa.
Segundo o contrato, o clube poderia ter adotado medidas para recuperar 51% das ações da 777 e reassumir o controle do futebol pelo valor simbólico de R$ 1 mil. Na época, o ge informou que o clima era de apreensão e desapontamento devido ao retardamento do repasse.
Falta de comunicação
O terceiro capítulo da insatisfação do clube se dá na gestão de Pedrinho. Dois meses após assumir a presidência da associação, o presidente enfrenta dificuldades de alinhamento com a empresa e critica a gestão da SAF. A relação entre as partes é distante, ocasional e repleta de pendências.
– Não estou chateado por não participar das decisões no futebol, estou chateado por não poder contribuir. Se tenho um sócio que deseje fazer uma contratação e eu, esportivamente, não estou alcançando resultados, seria natural discutir essa questão – destacou o presidente do clube em coletiva na quarta-feira.
Pedrinho entende que, como sócio minoritário, sua opinião não é definitiva, porém, ele gostaria de ter mais diálogo e acesso a informações. A associação almeja ser consultada sobre o destino dos investimentos e acredita que Lúcio Barbosa está errando ao prestar contas exclusivamente à 777, principal sócia. “Ele também faz parte de nossa equipe”, afirmou recentemente uma fonte ouvida pelo ge referente aos 30% de participação do clube na SAF.
Com os 70% das ações em posse da 777, ela detém o poder de decisão no futebol do Vasco. Ao clube associativo cabe fiscalizar o cumprimento das cláusulas contratuais, como os aportes financeiros e o pagamento das dívidas, que estão em dia. A SAF entende que alguns setores políticos do clube ainda não assimilaram a nova fase do Vasco e que uma simples troca de presidente não afetará o modelo de negócios.
O presidente do clube deseja resolver as questões de insatisfação diretamente com a 777, que se mostrou disponível para uma reunião presencial com Pedrinho. Entretanto, as partes ainda não conseguiram chegar a um consenso sobre a data do encontro.
Notificações da SAF
No decorrer da coletiva, Pedrinho utilizou a expressão “Não posso comentar” nove vezes para justificar restrições que o impedem de abordar questões internas e possíveis discordâncias com os gestores de futebol da SAF.
A “prudência” se faz necessária, pois, no início de fevereiro, a SAF notificou Pedrinho, alertando-o sobre a exposição de informações presentes no contrato com a 777 Partners. Na ocasião, a empresa ressaltou que o presidente poderia ser penalizado por vazamento de dados.
A gestão anterior também foi advertida acerca das cláusulas de confidencialidade do contrato enquanto Luiz Mello ocupava o cargo de CEO da SAF. No ano passado, Jorge Salgado concedeu uma entrevista ao ge, na qual fez uma análise dos três anos de mandato e abordou diversos temas ligados à SAF.
Fonte: ge