Diante das declarações do atual presidente do Club de Regatas Vasco da Gama, Pedro Paulo de Oliveira, em relação a mim, Sérgio Frias:
Na área da administração esportiva, tenho experiência. Concluí meu curso em gestão esportiva em 2001, em uma universidade, com duração de cerca de 20 meses – naquele tempo, o primeiro do país. Fui um dos poucos a questionar os impactos negativos que a Lei Pelé traria ao futebol brasileiro, sobretudo para os clubes.
Lembro-me de uma situação em que um professor propôs um problema sobre São Januário superlotado em um jogo contra o São Caetano, no ano de 2000. Modifiquei a questão, respondi conforme minha interpretação e obtive uma excelente avaliação.
Tive aulas com Eduardo Viana, um profissional bastante conhecedor, que evitava criticar o Vasco na minha presença. Ao questioná-lo sobre a oferta de uma disciplina sobre a história do futebol e das entidades esportivas, acabei sendo contratado por ele para colaborar em pesquisas sobre o tema.
Desenvolvi uma postura combativa em seminários, rejeitando a ideia de europeizar o futebol brasileiro, proposta por treinadores e gestores/supervisores da época.
A primeira palestra do curso foi ministrada por João Havelange. Quem teve a oportunidade de ouvi-la compreendeu o contexto daquela época, as oportunidades e os riscos para o futuro. No entanto, isso já é passado. Um passado distante.
O que antevi tornou-se realidade: o Brasil se tornou apenas um pequeno segmento no cenário do futebol mundial, repleto de teorias, narrativas e soluções acadêmicas, que na prática se deparam com os desafios diários, obstáculos, resultados esportivos, insatisfação do público, desproteção dos clubes em relação à legislação vigente e, obviamente, a desvalorização do real frente ao euro ou dólar.
Tudo isso não significa que eu estaria preparado para gerir um clube cujo esporte principal não vivencio diariamente (ou sequer tive a oportunidade de vivenciar, caso não me fosse dada a oportunidade), ao menos em uma posição administrativa, ou mesmo atuando no Conselho Deliberativo do próprio clube.
Quanto à questão das dívidas, espero que, ao cuidar do futebol (e não só dele), Pedrinho consiga evitar endividamentos, visto que estes derivam dos custos com o futebol. Afinal, as despesas com as demais áreas são financiadas, em sua maioria, pelas receitas do futebol, e o excedente destinado a outras finalidades acaba retornando à prática esportiva. É suficiente observar o orçamento do futebol e dos demais esportes, e os gastos proporcionais ao longo da história do Vasco, incluindo a era do Projeto Olímpico.
Gerir um clube sem estar envolvido diariamente com o futebol e operando com um orçamento contingente, evitando riscos, o que, em última análise, são de interesse do torcedor no contexto do futebol, pode ser considerado viável. Estamos falando de um Vasco que, desde 1914/1915, não depende da gestão do futebol como prioridade. Diferentemente do passado, onde investir no Remo era crucial, nos dias atuais esse esporte não desperta o mesmo fervor e interesse das multidões como nos primeiros anos de existência do clube.
Por outro lado, é louvável o desejo de Pedrinho em assumir a gestão do futebol como presidente do Vasco, integrando o futebol como componente essencial da administração do clube. Desejo sinceramente que isso se concretize, pois anseio por ver o Vasco controlando sua própria trajetória esportiva.
Diferentemente de outras pessoas, eu buscava essa independência quando a corrente de pensamento iludia os torcedores vascaínos, indicando um caminho oposto. Reconhecer erros e buscar corrigi-los faz parte do processo de evolução e aprendizado.
Um dos princípios fundamentais da gestão é fornecer segurança aos liderados como líder, algo que foi omitido durante a última coletiva conduzida por Pedrinho. Cabe a todos esperar que esse equívoco não se repita, pois ele não está ali representando a si mesmo, mas sim o Vasco, que deve ter voz ativa para questionar, sugerir e até criticar com responsabilidade qualquer indivíduo, considerando sua posição como acionista minoritário, embora atualmente não detenha o controle sobre o futebol do clube.
Delegar responsabilidades é importante na gestão, porém, não se resume apenas a isso. O gestor precisa ter uma compreensão abrangente do todo no qual está inserido, elaborar estratégias, objetivos e metas em conjunto com sua equipe, utilizando sua expertise e plano de gestão. Além disso, é fundamental que esteja preparado para enfrentar desafios que surgirem, pois, ao não compreender plenamente as particularidades de cada função delegada, o gestor pode ter dificuldades em solucionar problemas resultantes de falhas no organismo gerado.
Desde 1951, todos que passaram pela gestão do Vasco aprenderam a manter o clube com prudência, fato que culminou em 2008, com a menor dívida real entre os clubes do Rio de Janeiro.
O Vasco não atua em um vácuo, possuindo adversários e concorrentes. É importante confrontar os grandes clubes do futebol brasileiro, especialmente os do Rio, para avaliar seu desempenho.
A única gestão que conseguiu reduzir a dívida do Vasco foi a de Eurico Miranda, entre 2015 e 2017, após herdar uma dívida quase triplicada em seis anos e cinco meses (entre 2001 e 2008, a dívida real aumentou de aproximadamente 150 milhões para cerca de 230 milhões, mesmo após um período de retração financeira de 18 meses).
Todas as gestões subsequentes resultaram em aumento da dívida, sendo que a última chegou a vender parte do clube para tentar mitigá-la, revelando uma “dívida oculta” de 200 milhões de reais cerca de oito meses após a venda de 70% do futebol.
É importante destacar que a provocação que fizemos, associada a um requerimento administrativo de um membro do clube em conluio conosco, auxiliado por nosso assessor de imprensa, foi levada à tona na mídia convencional, pressionando a gestão do clube da época – que até então hesitava em exercer o direito de subscrição de bônus, mas acabou agindo corretamente, embora tal ação fosse uma obrigação.
Minha defesa em relação aos gestores do Vasco, sempre apoiados por mim, baseia-se nos resultados comparativos em relação aos adversários do Rio de Janeiro (todos inferiores ao Vasco) e do Brasil, os quais compartilham o mercado com o clube.
Apesar de não possuir formação acadêmica específica na área, Pedrinho ministrou palestras em diversos eventos, demonstrando competências superiores à teoria ao confrontar seus oponentes e defender com firmeza a grandeza e relevância do Vasco. Um exemplo a ser seguido.
Por fim, acredito que a função de presidente do clube deve se pautar em ações concretas para reverter qualquer situação desafiadora, sem se preocupar com opiniões alheias ou expectativas criadas ao seu respeito. O foco deve estar em restabelecer a estabilidade que, no recente apoio ao grupo de Pedrinho (em 2022) vindo do Conselho Deliberativo, mostrou-se irresponsável frente ao Vasco. É fundamental agir com responsabilidade, especialmente quando contratos de grande relevância estão envolvidos.
Caso Pedrinho almeje que o Vasco tenha autonomia na gestão do futebol, sem oposição interna, e a atual administração seja herdeira desse compromisso, que o clube retorne à glória e seja respeitado pelos adversários nos próximos três anos.
Particularmente, desejo uma reviravolta positiva, com Pedrinho, e portanto o Vasco, alcançando sucesso – não apenas como membro do setor esportivo, mas como um gestor capaz de conduzir o clube ao sucesso, seguindo os passos de Eurico Miranda, independentemente das circunstâncias ou opiniões divergentes.
Sérgio Frias
Fonte: Casaca