O ano começou sob a batuta de 777, Ramón Díaz e Alexandre Mattos, com promessas de grandes investimentos, trazendo a expectativa de um imenso aporte financeiro com o contrato da SAF. No entanto, o caminho foi marcado pelas desventuras de Álvaro Pacheco, a liderança de Pedrinho no futebol, o retorno de Coutinho, e terminou com a saída da empresa americana do controle da SAF, resultando em uma reformulação em toda a estrutura do clube.
Pedrinho, presidente do Vasco, e Josh Wander, ex-parceiro da 777 Partners — Foto: Reprodução
O trabalho inicial de Paiva levou o Vasco até as semifinais da Copa do Brasil e à construção de um bom desempenho no Brasileirão. Porém, uma sequência de jogos insatisfatórios resultou na demissão do treinador, que tinha potencial para comandar o time em 2025. A classificação para a Sul-Americana foi uma boa compensação para o atual cenário do clube em 2024, que começa com outro técnico e a expectativa da renovação de São Januário, porém com incertezas fora de campo sobre o futuro da SAF.
São Januário, Vasco x Juventude — Foto: Dikran Sahagian/Vasco
Expectativa de um Vasco competitivo
No seu segundo ano pleno como SAF, o Vasco começou 2024 embalado por promessas de grandes investimentos, ancorado na contratação de Alexandre Mattos como diretor de futebol e na continuidade de Ramón Díaz, deixando a nação vascaína cheia de esperança após as declarações do CEO Lúcio Barbosa sobre fortes aportes financeiros.
— Não posso prometer nada. Mas os jogadores que vierem terão a grandeza do Vasco. Queremos lutar na parte de cima da tabela a partir do próximo ano.
A equipe precisava de adições em todos os setores. A compra de João Victor para a zaga, por R$ 32 milhões – um atleta disputado por Botafogo, Cruzeiro e outros – elevou a régua de exigências da torcida. Logo depois, Marlon Gomes e Gabriel Pec, joias da base, foram vendidos, trazendo Sforza e Adson por valores significativos, além de David, Victor Luís e outros para compor o elenco.
Lesões no Carioca e derrota para o Nova Iguaçu
As piores notícias do Campeonato Carioca não foram apenas as duas atuações horríveis do Vasco diante do Nova Iguaçu. As contusões de Jair e Paulinho, que sacramentaram a ausência de dois pilares do meio-campo por praticamente toda a temporada, acarretaram um desfalque crítico. O setor, que já carecia de reforços, ficou ainda mais vulnerável. A solução encontrada foi Galdames, em parceria com o Genoa, também da 777, mas a aposta não deu certo.
Jair e Paulinho sofreram com lesões no Vasco em 2024 — Foto: Leandro Amorim/Vasco
Os confrontos contra o Nova Iguaçu acenderam um sinal de alerta no Vasco. O desempenho foi muito aquém do esperado, e mesmo com Ramón Díaz afirmando que a equipe alcançaria a final, a necessidade de reforços para o Brasileirão ficou evidente, e as contratações não vieram.
Saídas de Mattos, Ramón e Emiliano
Alexandre Mattos foi desligado do cargo de diretor de futebol em 21 de março, resultado de uma decisão do CEO Lúcio Barbosa, respaldada pela 777 Partners. A relação entre eles foi conturbada durante todo o período. Logo após sua chegada, Mattos se ofereceu para atuar na CBF e no Corinthians.
Foram R$ 120 milhões gastos em apenas 100 dias para trás de nove contratações. Porém, carências continuavam sem solução, e a herança de Mattos incluía contratos e transferências pendentes. A contratação de Clayton Silva é um exemplo disso, investindo R$ 18,8 milhões por um jogador que não se firmou e logo foi emprestado após apenas oito jogos.
Alexandre Mattos apresenta Clayton, novo atacante do Vasco — Foto: Thiago Ribeiro/AGIF
Ramón Díaz e Emiliano, que também enfrentaram desavenças com Mattos e a 777, deixaram o clube um mês depois em um clima tenso. Após uma derrota para o Criciúma, o Vasco anunciou a saída da comissão técnica. Enquanto o clube alegou que a dupla pediu demissão no vestiário, os argentinos afirmaram ter sido demitidos via Twitter. As disputas entre as partes estão agora nos tribunais.
Ação contra a 777 e controle do futebol nas mãos de Pedrinho
Em 15 de maio, a 4ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro acatou o pedido do Vasco e retirou o controle da SAF das mãos da 777 Partners.
Com o compromisso de supervisionar a SAF, Pedrinho buscou dialogar com a 777, mas esse diálogo nunca ocorreu. A coletiva do presidente do Vasco em 26 de março, onde disse “não posso falar” nove vezes, evidenciou a situação conflituosa, culminando em uma ruptura. Acusações sobre o não cumprimento de cláusulas contratuais por parte da 777 e a busca por garantias financeiras levaram o Vasco a processar a empresa americana.
Recentemente, o ge informou que o Vasco descobriu que a 777 não poderia arcar com os salários e imagens atrasadas dos jogadores, e isso é um dos pontos que o clube utiliza na arbitragem na FGV, que resolverá a disputa judicial.
O movimento do departamento jurídico sob a gestão de Pedrinho ocorreu sob o excesso de denúncias jurídicas nos Estados Unidos contra a 777 Partners. O fundo Leadenhall acusou a empresa de estar montado sobre uma estrutura instável, sob o comando de outra firma — a A-CAP.
Pedrinho em posse como presidente do Vasco — Foto: Fotos: Dikran Sahagian/Vasco da Gama
Um furacão português
A passagem de Álvaro Pacheco pelo Vasco foi breve, intensa e desastrosa. Contratado por Pedro Martins e Lúcio Barbosa em um dos últimos atos da 777 no comando do clube, o técnico português chegou ao clube em meio à transição da saída da empresa americana e a entrada de Pedrinho.
Álvaro Pacheco e Pedro Martins sendo apresentados no Vasco — Foto: Leandro Amorim / CRVG
A estreia não poderia ter sido mais infeliz. Com a equipe motivada pela classificação na Copa do Brasil diante do Fortaleza, ainda sob a supervisão de Rafael Paiva, Pacheco fez sua estreia contra o Flamengo para um Maracanã lotado. O vexame foi monumental: 6 a 1, um resultado que deixou a torcida e a diretoria extremamente insatisfeitas com o português e os jogadores.
No dia seguinte à tragédia, Pedrinho anunciou mudanças imediatas. Felipe, ídolo vascaíno e aliado político do presidente, assumiu como diretor-técnico. Desde o início, a dupla tinha reservas com Pacheco, mas foi após um empate com o Cruzeiro em casa que a relação degringolou.
Em uma reunião em São Januário após uma partida que terminou sem gols, Pacheco afirmou que a equipe tinha evoluído em campo. Felipe discordou e Pacheco não aceitou bem a crítica. No dia seguinte, no CT Moacyr Barbosa, os dois conversaram novamente sobre a performance da equipe, como era o hábito com outros técnicos.
O principal ponto de discórdia foi a insistência em bolas longas para Vegetti, mesmo com poucos jogadores no meio de campo para ganhar as segundas bolas. Álvaro deixava claro que Felipe queria ocupar seu lugar. Pedrinho tentou harmonizar a relação, mas já se sabia internamente que a passagem do técnico português seria breve. Ele foi demitido no jogo seguinte, após uma nova derrota para o Juventude. Seu resultado foi de quatro jogos sem vitória.
Álvaro Pacheco, técnico do Vasco — Foto: Thiago Ribeiro/AGIF
A turbulência não parou. O CEO Lúcio Barbosa também saiu, insatisfeito com a intervenção de Pedrinho e Felipe na administração do clube. Após trazer Pacheco e Emerson Rodríguez em um período tão curto, Pedro Martins também deixou a sua posição incomodado com a direção.
Menos de seis meses após a virada do calendário, as figuras de Ramón Díaz, Emiliano, Alexandre Mattos, Lúcio Barbosa e 777 Partners já não estavam mais presentes no Vasco.
A chegada de Rafael Paiva
O clima na partida entre Vasco e São Paulo, pela 11ª rodada, era de crise total. Com a equipe no fundo da tabela, sem treinador, CEO ou diretor de futebol, o clube encarava um adversário complicado, diante de pouco mais de 5 mil torcedores. Sob vaias e protestos, o time saiu atrás, porém conseguiu uma reviravolta histórica, não só na partida, mas na temporada.
Sob a liderança de Rafael Paiva, o Vasco desfilou um lindo futebol, venceu o São Paulo por 4 a 1 com um show dos jovens da base, como Estrella, JP e Leandrinho, e saiu da zona de rebaixamento. Essa performance não apenas garantiu a recuperação na tabela, mas também apontou uma nova direção para o clube nos meses seguintes. Com Paiva, o clube deu oportunidades para reforços que não estavam em campo, como João Victor e Adson, enquanto renovava o elenco ao valorizar os garotos.
Leandrinho, Estrella e JP, do Vasco, na partida contra o São Paulo — Foto: Leandro Amorim / CRVG
O time chegou a emplacar quatro vitórias seguidas no Brasileirão, feito que não acontecia desde 2012, quebrou um jejum de cinco anos ao vencer o Internacional no Beira-Rio, e ainda derrotou o Corinthians após 14 anos. O Vasco ascendeu para a parte superior da tabela e se manteve vivo nas fases da Copa do Brasil.
Vegetti e Lucas Piton, Vasco x Corinthians — Foto: Thiago Ribeiro/AGIF
A Barreira virou baile
A chegada de Coutinho foi a guinda do ótimo momento do Vasco no meio do ano. No início de julho, a torcida vascaína vivia a expectativa do retorno de uma das mais promissoras revelações da base na última década. O meia vestiu a camisa 11, foi recebido com grande festa em São Januário e contagiou a torcida, que dançava ao som do hit “A Barreira Vai Virar Baile”, que ficou na cabeça dos torcedores por muito tempo.
O começo, porém, foi desafiador. Nos quatro primeiros jogos, foram duas derrotas e dois empates, até que Coutinho se lesionou e ficou fora do time por sete partidas, perdendo a disputa nas quartas de final da Copa do Brasil contra o Athletico e em uma boa sequência no Brasileirão. Sua volta aconteceu diante do Flamengo, e ele teve a estrela de empatar a partida com um gol no último minuto.
Coutinho comemora gol do Vasco contra o Flamengo — Foto: André Durão
A janela do meio do ano
A primeira janela de contratações com Pedrinho e Marcelo Sant’Ana poderia ter ficado marcada pela volta de Coutinho, mas acabou sendo decepcionante para a torcida. O Vasco já havia definido desde o início a prioridade: um zagueiro.
Após várias negativas e negociações mal sucedidas, como com Ian Glavinovich, André Ramalho, Adryelson e Danilo, o clube encerrou a janela sem garantir um defensor titular. As chegadas de Coutinho, Souza, Alex Teixeira e Emerson Rodríguez, além de Jean David e Maxime Domínguez, mostraram falta de direção nas contratações, sem resolver as carências do elenco.
Diretor de futebol Marcelo Sant’Ana e Pedrinho, presidente do Vasco — Foto: Leandro Amorim/Vasco
Do sonho à frustração na eliminação da Copa do Brasil
A campanha do Vasco na Copa do Brasil foi recheada de emoções. Desde a vitória sobre o Marcílio Dias, passando pelas classificações duras contra Água Santa, Fortaleza e Atlético-GO em São Januário, até a luta contra o Athletico-PR nas quartas de final, a trajetória empolgou a torcida.
Gol de Vegetti, do Vasco, contra o Athletico-PR — Foto: Gabriel Machado/AGIF
O clube teve sua melhor performance na Copa do Brasil desde 2011, atingindo as semifinais contra o Atlético-MG. Após abrir o placar em Belo Horizonte com um gol de Coutinho, o Vasco assistiu a vantagem desaparecer rapidamente devido a falhas em momentos cruciais, com os gols de Paulinho e Arana.
O jogo de volta em casa foi um grande evento para a torcida, que esperava ansiosamente. Vegetti fez o gol inicial e a partida caminhava para um embate nos pênaltis até que Hulk acertou um foguete fora da área e encerrou o sonho de título da equipe.
Eliminação deixa sequelas no Brasileirão, e Paiva é demitido
Após a eliminação na Copa do Brasil, o Vasco se aproximou de garantir sua permanência na Série A com vitórias sobre Cuiabá e Bahia em casa. O foco havia se transferido para a briga por uma vaga na Libertadores do próximo ano.
No entanto, tudo desmoronou após a derrota para o Botafogo por 3 a 0 no Nilton Santos. A equipe foi superada pelo Fortaleza, Internacional e Corinthians, apresentando um desempenho muito abaixo do esperado, e Rafael Paiva foi desligado do comando. As principais razões foram a maneira de jogar nos últimos meses, a perda de controle no vestiário e decisões que incomodaram a diretoria.
O time não se recuperou após as lesões de Adson e David, e Paiva não encontrou soluções dentro do limitado elenco para suprir as ausências. O mesmo esquema que havia levado Paiva a acertos também se tornou motivo da sua saída.
Rafael Paiva observa Corinthians x Vasco — Foto: Marcos Ribolli
Felipe assumiu a cadeira interinamente e tropeçou em sua estreia contra o Atlético-GO, mas conseguiu uma recuperação ao vencer Atlético-MG e Cuiabá, deixando a equipe na décima posição e assegurando a vaga na Copa Sul-Americana.
Indefinições fora de campo e desafios em 2025
O Vasco termina a temporada tendo que resolver questões internas e externas. Enquanto busca reformular o elenco com novos contratos e saídas, o clube passa por uma reestruturação financeira. A direção sabe que não pode se aventurar em gastos excessivos e continua na busca de um novo comprador para a SAF, após o afastamento da 777.
A missão não será simples e não será resolvida de forma rápida. É um processo longo, repleto de batalhas judiciais no Brasil, como a arbitragem na FGV entre Vasco e 777, e também no exterior, com disputas entre 777, Leadenhall e A-CAP. Existem interessados na aquisição da SAF, mas até o momento nenhuma proposta concreta foi apresentada.
Dentro das quatro linhas, a diretoria foi obrigada a acelerar a busca por um novo técnico. A procura durou cerca de um mês, até que Fábio Carille foi anunciado como o novo comandante do Vasco. Desde o início, a diretoria procurou por alguém com experiência no futebol brasileiro e que se comunique na língua portuguesa.
O Vasco se depara com um 2025 cheio de expectativas sobre a nova venda da SAF, as reformas de São Januário já iniciadas em 2024, a contratação de uma nova fornecedora de materiais esportivos, além de muitas questões externas relacionadas à redução de dívidas do clube.
Nos gramados, o clube sabe que não pode dar passos em falso no planejamento. Nos últimos dois anos, as despesas com a montagem do elenco foram altas e as decisões falharam, especialmente nas duas janelas de 2024. A equipe possui uma base sólida, mas precisa urgentemente de novas caras para cobrir as lacunas, como a contratação de um zagueiro e um ponta.
Um ano com tranquilidade no Brasileirão e campanhas dignas da história do Vasco na Copa do Brasil e na Sul-Americana são as esperanças da torcida para 2025, além de que as questões acerca da SAF e as reformas em São Januário sejam resolvidas com a velocidade que os assuntos exigem.
Fonte: ge